quinta-feira, 28 de julho de 2011

soneto a quatro mãos

Tua memória, pasto de poesia, 
tua poesia, pasto dos vulgares, 
vão se engastando numa coisa fria 
a que tu chamas: vida, e seus pesares.
[Carlos Drummond de Andrade]
Fui pela estrada a rir e a cantar
 
As contas do meu sonho desfiando... 
E a noite e dia, à chuva e ao luar, 
Fui sempre caminhando e perguntando...
[Florbela Espanca]
Insiste em quê?Ganhar o quê? De quem?

O meu parceiro...eu vejo que ele tem
um riso silencioso a desenhar-se
[Mario Quintana]
O mar tem fim, o céu talvez o tenha,
 
Mas não a ânsia de Coisa indefinida 
Que o ser indefinida faz tamanha. 
[Fernando Pessoa]


                Antes eu sofria um bocado pra escrever sonetos. Acho que agora engatei! São um exercício ótimo pra vocabulário, sabe? E esse aqui, especialmente, foi um prazer escrever. Me deparei com um tercetinho cheio de potencial sonetístico no blogue de Candy e, há muito, eu tinha vontade de escrever algo com o danado. Bom, saiu. Espero que gostem! J


A minha teimosia não é prosa,
é poesia!, é caixa de Pandora!
Carrega em si tal mote que a glosa
suspira, embriagada pela aurora

do meu versar; A musa me é senhora,
dona de mim. É rara, é perigosa,
sabe fazer-me mudo e sabe a hora
de me açoitar com pedra, pau & Rosa.

Mas se hoje me aventuro no relevo
incerto do meu texto é porque o pranto
é menor que o desejo; E, feliz, clamo:

Eu não sei escrever, mas eu escrevo.
Não sei como cantar. Contudo, canto.
Nada sei eu do amor, no entanto amo.




terça-feira, 19 de julho de 2011

para você, meu querido caê

‘cantar é mover o dom
do fundo de uma paixão’
[Djavan]


uns pés, uns mãos, uns cabeça, uns só coração
                No último sábado, 16 de Julho, estive com a BandaUns na ‘Alegria, alegria – Noite a Caetano’, cantando este que é such a referência pra mim e pra tanta gente Brasil afora.
Eu já havia escrito um poema pro Chico, e achei por bem aproveitar essa oportunidade pra escrever um texto pro caê J Esse título – coisa mais fofa, né? - eu tirei d’um álbum que conheci em tão belo momento da minha vida, em tão belo contexto. Li este poema entre uma música e outra lá na Casa de Musicultura. Hope you like it!

não me espanta
a lábia
o labirinto
de quem canta.

não me espanta
o grito
saindo da tua
garganta.

não me espanta
o poema
o sim, o cinema
luzeiro que encanta.

me espantam
as vozes, o prazer
sem explicação
sem por enquanto.

abro a boca
e crio o eco:
‘por ser feliz, por sofrer
por esperar, eu canto.’


segunda-feira, 11 de julho de 2011

immerso

‘coração de eterno flerte
adoro ver-te’
[Caetano Veloso]



         Como inventei de fazer um poema longo, resolvi economizar na apresentação. Este aqui foi e é desafio; Foi e é resposta, e ainda parte de jogo (ou jogo em quatro partes). Espero que agrade! J



I
Il fait froid dans mon coeur.

II
como se fosse sábado, e nem era, fui a teu encontro.
quebrar barreiras, gerar encanto,
sonhar o sonho.
feito poema, tímido, você sorriu
 - e eu também.
poesia filosofia academia
a n tro po fag ia dentes-orelha-queixo
brilha nos olhos um calor que se renova
a cada abraço,
a cada beijo,
a cada hora.

III
deitar pra perguntar:
há texto
em nosso silêncio?

IV
não mais dor,
não mais estio.
línguas francesas
que me preencham
o vazio.




sábado, 9 de julho de 2011

astronauta da saudade

‘a saudade mata a gente’

Faz uns seis meses que publiquei cá ‘um’ poema a dez mãos, um poema feito de abraços y aperreios.  As deusas quem sabem o porquê d’eu haver demorado tanto pra trazer a tona este segundo! Mais uma vez minhas outras cabeças se juntam mais eu pra trazer estes versinhos sobre tema proposto por Candy, retirado d’uma canção bonita do Jorge Mautner. Espero que gostem J

I [Luíza]
vem, menino, e não tarda!
 
vem logo me dizer da lua 
e dos segredos dela! 
me diz se ela é de queijo 
e se ele é bom. 
me diz se a poeira lunar 
te faz espirrar! 
me diz se quando minguante 
tu escorrega e cai 
ou se quando nova 
tu desaparece com ela! 
vem, menino, e não tarda! 
vem que o espaço, 
meu menino astro, 
fica muito melhor 
contigo aqui comigo.

II [Matteo]
Quando ficava sem sono sozinho de madrugada, gostava de ir na estante que ficava no quarto e procurar alguma revista interessante da coleção do pai e ficar lendo as matérias. Eram sempre curtas o suficiente para preencher uma noite, eram mais práticas, e sempre aprendia algo de novo. Um dia achou uma Scientific American de algumas décadas atrás, e se divertiu lendo sobre o efeito do movimento da lua nas marés. Ia lendo e olhando pela janela, a cada linha admirando mais aquele buraco branco pregado na noite. Se ela exercia um poder tão grande sobre os oceanos, milhões de toneladas de água, o que fariam com, sei lá, o sangue de uma pessoa? Imagine então se alguém fosse à lua? Alguma reação alquímica com certeza faria no coração alguma mágica descrita quem sabe em alguma parede cheia de hieróglifos de algum templo egípcio construído com a ajuda dos seres cósmicos, que conhecem melhor aqueles lugares. Decidiu ele mesmo ir verificar, escolheu uma noite estrelada, preparou alguns sanduíches, uma garrafinha d’água e foi até a lua, sem avisar a ninguém. Quando chegou lá, a lua já não fazia efeito nenhum, mas a Terra já puxava todo o sangue de seu coração em sua direção, como se fosse uma Meca das hemácias. Descobriu que não era a lua que fazia a mágica, era a distância, que deixava um vazio cardíaco. Terminou o sanduíche e voltou correndo.

III [Gustavo]
me sento numa esquina de lua. ao redor, vê-se estrela nenhuma.
daqui onde me encerrei, vejo o mar que azula o planeta que você me abandonei.
vejo meu país, vejo outros países
vejo as luzes da guanabara, vejo as luzes de paris
vejo as luzes da sua tv transmitindo a novela das oito
vejo a luz dos seus olhos brilhando de sal
pela baboseira televisiva que insiste em imitar a baboseira do vida-a-dia.
Estrela, meu olho me indaga em todas as luas
quem de nós primeiro abandonou o outro.
se fui leviano, foste cadente
nossa terra nos foi frívola, nossa urgência urgente
ai, Estrela, como dói.
lembro d’uma vez, você me perguntou, ‘Mas se flutuam os homens quando na lua
flutuam também seus corações?’,
e eu respondi com um sorriso fluto.
minhas lágrimas cá não flutuam – caem como edifícios, desabam como famílias
o eco de suas pancadas quando tocam o chão
esvazia a humanidade das bandeiras aqui fincadas.
você desliga a tv, Estrela. por quê?
fim de novela, adeus telefenestra sinistra.
você acalenta o próprio sono, como?
a guanabara se apagou
paris se apagou, nosso país se apagou.
brilho só, agora, sobre esta esquina de lua.
a saudade se assenta cá ao meu lado,
fecha os olhos e, sinceramente,
também chora.

IV [Marília]
No espaço sideral

Sonha que aquela estrela é ela
Cadente, de fogo
No calor dos beijos de outrora
Seu satélite natural,
Em meio a tantas Luas.
Desbravando os céus
Lembra do planeta azul
Onde deixou os olhos,
Os abraços, o amor...
Se jogou no espaço
Pisou na Lua
Descobriu Vida em Marte
Tropeçou em outros mundos
Caiu num buraco negro
E se desfez em saudade
Perdido, pelas galáxias
De amor.

V [Candy]
no espaço vazio da solidão

o astronauta da saudade tenta não lembrar
das noites que pareciam eternas,
dos beijos que pareciam promessas,
dos planos que pareciam sem fim.
vai, astronauta, aprende
não adianta sonhar
amor não vive nas nuvens
amor se pisa no chão
que é pra não morrer de ilusão